quinta-feira, 19 de maio de 2011

Águas do meu país

Veio-se hoje a saber que existiu (existe?) um plano para a privatização da empresa "Águas de Portugal".

Calculo que se falará sobre as mentiras do Sócrates, do escândalo que é agora aparecer a não querer privatizar o que antes parece que já quis.

Mas essa é apenas parte do escândalo. É apenas a parte o escândalo de que é útil que se fale.

O que acima de tudo não interessa que se fale é do escândalo que é privatizar as "Águas de Portugal". O que acima de tudo não interessa que aconteça é que os cidadãos se lembrem que aquilo que vai ser privatizado é um recurso público, um recurso fundamental para todos, um recurso do qual todos dependemos, um recurso que neste momento ainda controlamos (através do escasso controlo que exercemos sobre o estado por via eleitoral) mas que, precisamente por ser fundamental, vale muito. E quando digo muito, refiro-me a muito mesmo: tanto ou mais do que os negócios da saúde, e essa já valia tanto como o tráfico de armas (ver aqui). E como vale muito existem muitos que estão dispostos a comprá-lo ao Estado (i.e., a nós!). Para o administrar, controlar o seu preço, e lucrar (muito) com ele. Tudo, claro está, a bem da nação, a bem do combate à dívida, e a bem do próprio Estado, evidentemente. Que está gordo, e endividado, e impede a iniciativa privada e etc e tal (ver aqui).

São por demais óbvios os conluios entre governantes e empresas no desbaratar de recursos nacionais. Das barragens, aos contentores de lisboa, das parcerias público privadas à recente onda de privatizações, do salvamento do BPP às garantias financeiras aos bancos fixadas no MoU. Veja-se o caso da recente legalização da alteração unilateral dos spreads fixada ontem pelo Banco de Portugal (aqui). A quem serve? aos cidadãos? não, aos bancos. Veja-se o caso da privatização dos seguros de CGD? a quem serve? aos cidadãos? não às companhias de seguros de saúde.(ver aqui e aqui).

A privatização das Águas de Portugal é apenas mais um exemplo. Mais grave, talvez, mas apenas mais um exemplo. É por demais óbvio que não existe moral. É por demais óbvio que é pura perda de tempo apelar à ética. O tempo corre a favor dos mesmos, a favor desses mesmos interesses. Depois de 5 de Junho, dir-nos-ão para esperarmos mais quatro anos. Porque temos de respeitar a vontade democrática. A bem da democracia. De uma democracia em que o estado controla cada vez menos, e consequentemente o governo controla cada vez menos, e consequentemente o nosso voto controla cada vez menos. E se protestarmos, dir-nos-ão que somos minoritários, que devemos esperar...sossegados.

Desassossego precisa-se. Antes de 5 de Junho. E já vem tarde.

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